Na medida em que o tempo passava, corríamos o risco, Eduardo e eu, de ser os únicos na plateia. O horário da sessão de quinta-feira já se aproximava e, com exceção das pessoas do teatro que circulavam no saguão, apenas um som ambiente permeava a espera. Na rua estreita e sem carros, o paredão de prédios fazia um isolamento acústico e de mundos. Nem parecia que estávamos tão perto da movimentada rua da Consolação.
Confesso ficar triste com teatro vazio. Principalmente por estar em São Paulo, cidade com tanta opção cultural e tão enorme população. Fico pensando no trabalho que é idealizar um espetáculo -pesquisas, ensaios, produção, apoios, patrocínios etc.- para eventualmente amargar noites quase sem público. E, ai, meu Deus, se o espetáculo não fosse bom, não conseguiríamos fingir o contrário.
Afinal, descemos as escadas. Quase como num culto religioso, o clima que antecede o "ao vivo" é sempre único. Há expectativa para o insólito, creio que tanto da parte do espectador quanto da parte de quem atua. E lá estamos, de chofre, nos primórdios do século passado, vivendo historietas de flertes, não, de namoros, não, de amores e casamentos, sabe-se lá, uma mistura relacionada a afetos e à solidão social. Eis o universo de Dorothy Parker: transitar pelo humor, a princípio abobalhado, quase infantil, mas também sagaz e crítico, para revelar o individual das carências e fragilidades. Em especial no mundo feminino.
O grupo de oito atores, cinco mulheres e três homens, que se movem em cena é uma delícia. Com a graça de uma dança ragtime, inclusive com números de sapateado, a adaptação nos instala com conforto na época. Como se estivéssemos assistindo às tramas pela janela de casa. O belo figurino, em conjunto com a iluminação, são ingredientes que por si dispensam um mobiliário de época. Porque importa a maneira como as histórias, entrelaçadas entre riqueza, proletariado e boemia, são contadas. Depois de muito rir com os atores, o desfecho nos vai encaminhando para um estado de abandono. O jogo de cena, muito bem aproveitado pela quantidade de mulheres a interpretarem a mesma personagem, mostra a ambivalência da condição humana, suas semelhanças e dessemelhanças. No entanto, a figura dos homens, às vezes tão ou mais frágil, reforça o quadro de valores e padrões de um período histórico e econômico difícil. A vida em guetos, a clandestinidade, outros subterrâneos como esta sala que, ao final da apresentação, tem a luz acesa para aplaudirmos com alegria o elenco.
Um privilégio terem decidido pelo "sim" em apresentar a peça na quinta-feira deserta. Vibramos como se levássemos a energia de uma plateia lotada. E de sobra ainda trocamos cumprimentos e boas palavras com direção e parte do elenco. Sorte a minha ter um amigo de longa data que se encarrega do teatro. Noite inesquecível no Pequeno Ato.
Obrigada pelo carinho imenso, Julio! Você foi ótimo, simplesmente ótimo! Beijo carinhoso.
ResponderExcluirDébora, muito obrigado. Imagino que das "Big Loiras" você seja a que conversou um pouco mais com a gente na quinta-feira. Beijo grande.
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