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sexta-feira, 25 de dezembro de 2015

CARTÃO DE NATAL DA DENTISTA



Vira e mexe minha dentista dá motivo para que eu escreva sobre ela. Fico pensando nisso. Acho que já falei mais dela do que de qualquer outra pessoa. A culpa é dos contrastes. Embora bonita, de estrutura delicada, a doutora não tem nada de mulherzinha. Pesa a mão de vez em quando, dá suas gargalhadas, compactua com as minhas besteiras. Deve ter sido homem em outra encarnação. Expressa suas opiniões sem cerimônia e desfila assuntos um atrás do outro como qualquer mulher. Quem, ao vê-la, achar que se trata de mais uma dondoca dos Jardins, estará iludido. Vestida, maquiada e "escovada" com classe, vem a primeira impressão: fina. E é. Acontece que sabe descambar no humor e na franqueza de quem tira o jaleco. 

De mim com relação a ela, dois estados de espírito se aplicam: liberto e desarmado. Em muitas ocasiões, depois de sofrer na cadeira de tortura, saio do consultório achando que vale a pena viver, apesar de depenado no bolso e na boca. Sim, estou exagerando.

Hoje, dia de Natal, o motivo para falar da dentista é o cartão, via correio, que ela mandou. Tão em desuso quanto o disco vinil, quanto as gravações em fitas cassetes, esse cartão faz renascer uma delicadeza antiga. Antiga não pelo tempo decorrido da prática, mas porque as intenções incrustadas da era digital soam diferentes. Antiga por refazer a emoção do aguardo -tanto na ida como na vinda- de notícias, e a certeza de que a outra pessoa tocou no mesmo papel.  

Feliz Natal, doutora, com sua família, com seu filhinho lindo e figura. Que possamos sempre nos reencontrar para dividir levezas, ainda que os pesares da vida continuem a existir.

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