PESSOAS QUE NÃO SÃO MAIS DAQUI

NOS ÚLTIMOS DIAS EU TENTEI DE VÁRIAS FORMAS FALAR SOBRE A MORTE DE UM PRIMO MAIS NOVO. NÃO CONSEGUI. FALHEI AO TENTAR UMA REFLEXÃO, FALHEI AO TENTAR HOMENAGEÁ-LO. AGORA TENTO APENAS COMPREENDER UMA PARTE DESSE EPISÓDIO.

O VELÓRIO DE PARENTES, ALÉM DE MOBILIZAR MUITAS PESSOAS, É SEMPRE UM EVENTO GRANDILOQUENTE DE DOR, DOR QUE SE MULTIPLICA CADA VEZ QUE CUMPRIMENTAMOS TIOS E OUTROS PRIMOS. PARA CADA UM QUE REVEMOS, VEM A LICENÇA PARA CHORAR E SOFRER MAIS UM TANTO. ENTENDO SER CATÁRTICA E NECESSÁRIA ESSA LIÇÃO, POIS DE ALGUMA FORMA APAZIGUA A FAMÍLIA E A NÓS MESMOS.

POR OUTRO ÂNGULO, VÊM A NÓS NOSSA DOR INDIVIDUAL, NOSSA CULPA, NOSSO CONSTRANGIMENTO PELA MORTE DO PARENTE, TODA A INTIMIDADE QUE AINDA TÍNHAMOS, E A QUE JÁ NÃO TÍNHAMOS, TODA A NOSSA INFÂNCIA E JUVENTUDE COMPARTILHADAS.

FALAR DE UM SER FALECIDO, PRIMO, UM DOS PRIMEIROS AMIGOS, É FALAR DE ALGUÉM QUE JÁ NÃO PRECISA DE NÓS, ALGUÉM QUE JÁ NÃO É DESSE MUNDO, MAS CUJA LEMBRANÇA É TÃO NÍTIDA, TÃO PRESENTE, QUE PARECEMOS ESTAR VIVENDO UM EPISÓDIO DE FICÇÃO. LEMBRO ATÉ HOJE A FORMA COMO MINHA AVÓ, NA DÉCADA DE 1970, COMENTAVA EM CONVERSA COM OUTRA PESSOA SOBRE MEU IRMÃO MAIS VELHO, FALECIDO RECENTEMENTE.

-O SÉRGIO MORTO? A GENTE FALANDO ASSIM, PARECE MENTIRA.

SIM, PARECIA. HOJE, A MORTE DE MINHA PRÓPRIA AVÓ É UMA REALIDADE DE MAIS DE VINTE ANOS JÁ ACEITA.

NESSE PERÍODO AINDA DE TRANSIÇÃO COM RELAÇÃO À MORTE DE MEU PRIMO, UM POUCO DA MÚSICA DE BACH TALVEZ TRADUZA ESSE SENTIMENTO. MESMO CLASSIFICADA COMO UMA CANTATA PROFANA, QUE TERIA SIDO COMPOSTA DE ENCOMENDA, NÃO DÁ PARA DIZER QUE ESSA MÚSICA PERTENÇA APENAS A ESTE MUNDO. PELA BELEZA SERENA E ETÉREA, CREIO QUE ELA CUMPRE A MISSÃO DIVINA DE NOS PROTEGER E FAZER ACEITAR AS COISAS QUE AINDA PARECEM MENTIRA.